A festa da aldeia era a época que mais detestava na aldeia. Foi só passar a ter liberdade de não ir para não lá voltar a meter os pés. Nada naquela festa me parecia festivo. Missa e procissão? Almoços de família? O mais festivo ali eram as bandeiras a enfeitar as ruas. De resto, passei a adolescência, essa época fabulosa em que achamos que sabemos tudo sobre ser fixe, a achar que uma festa da aldeia parecia a coisa mais foleira da vida. Devia ser por isso que as pessoas das cidades se achavam tão melhores do que as das aldeias… até ter chegado junho de 2016 e em Lisboa, nos Santos, dei por mim a ver o mesmo tempo de ambiente e personagens de uma festa da aldeia. Afinal, os das cidades eram hipócritas: eles também tinham festas da aldeia. Só que fingiam que era mais giro ver gente trajada a descer a Avenida da Liberdade e que os bailaricos nos bairros eram diferentes do bailarico do largo da igreja de uma aldeia de duzentos habitantes.
Por essa altura, eu já não ia a festas da aldeia. Já nem vou. Mas fui descobrindo que gosto de algo das festas populares. Não é só as bandeiras a enfeitar as ruas. Gosto destas festas que não exigem as nossas melhores roupas, almoços na melhor loiça disponível, comida capaz de alimentar o dobro das pessoas, ilusões de famílias que se dão bem só porque passam festas juntos. Descobri que aquilo de que gosto nas festas populares é vê-las ser do povo: é a banda sonora ser aquela que todos fingimos não conhecer, é o cheiro a assados que parece que nos acompanhará durante semanas, é a tradição que se mantém mesmo que a necessidade turística tente intrometer-se.
Quando nos juntávamos no meio da rua para fazer assados e fogueiras com cheiro a rosmaninho era mais festa do que qualquer outra festividade que pudesse haver naquelas ruas. O São João não era para famílias fingidas, não era para indumentárias de grande exigência. O São João era — e é cada vez mais — para os amigos, para as tradições que mantemos e as que queremos criar, com cheiro a manjericos, para descobrirmos a nossa melhor alma popular, desejosa de cantar os êxitos da música pimba como não houvesse amanhã. Como diz Germano Silva, o São João aqui no Porto é único. «É o cheiro a gente e a manjerico; uma alegria irreprimível que se expande do coração das pessoas e sobe ao ar como um fogo de artifício.»
Bom São João!
Esta semana no daylight
Começou o verão e a tradição manda que haja uma TBR específica para esta estação do ano. Se me entusiasmei e escolhi muitos livros? Talvez. Mas agora já não dá para mudar. A TBR para o Verão 2025 está aqui.
A viver nas páginas de…
A Tree Grows in Brooklyn, de Betty Smith
Nunca me tinha acontecido tal coisa, mas, no dia em que anunciaram os livros de junho do Clube do Livra-te, entrei na Amazon para procurar o ebook de A Tree Grows in Brooklyn, a escolha da Rita, e o site disse-me: leia agora. Leia agora? Como assim, agora? Eu não tenho este ebook! Bem, aparentemente tinha. Tinha-o comprado por oitenta cêntimos no dia 9 de junho de 2024… como é que me esqueci de um livro que comprei? É um mistério, mas a verdade é que o ebook estava mesmo no meu kindle. Se já estava interessada em participar na leitura conjunta, assim nem tinha desculpa — na verdade, devia um pedido de desculpa ao livro.
A Tree Grows in Brooklyn, traduzido para português como Uma Árvore no Céu de Brooklyn, é um pequeno calhamaçoclássico da literatura americana e a sinopse, em português diz assim:
No início do século XX, num bairro de Brooklyn, Francie Nolan cresce rodeada de pobreza, sonhos e desafios. Filha de Johnny, um sonhador carismático, mas destruído pelo alcoolismo, e Katie, uma mãe trabalhadora e determinada, Francie aprende desde cedo a observar a beleza nas pequenas coisas e a lutar por um futuro melhor.
Apesar disso, a força da família e a determinação da mãe em garantir uma educação para Francie e para o seu irmão, Neeley, convertem-se em pilares da sua jornada. Num bairro repleto de contrastes, e enquanto enfrenta a dura realidade da sua infância, Francie encontra refúgio nos livros e no desejo de ter uma educação, acreditando que o conhecimento é a chave para escapar das dificuldades que a cercam.
Como uma árvore resistente que cresce nos lugares mais improváveis, Francie cultiva sonhos e agarra-se à esperança, mesmo quando tudo parece estar contra ela.
Repleto de momentos de ternura, luta e superação, Uma Árvore no Céu de Brooklyn é uma história intemporal sobre a coragem de crescer e de acreditar num amanhã melhor, mesmo quando tudo parece impossível.
Betty Smith oferece-nos um retrato inesquecível de uma jovem que se recusa a ser derrotada pelas circunstâncias e de um lugar onde mesmo as árvores mais delicadas conseguem crescer.
Recomendação aleatória da semana
Hugo Gonçalves no Ponto Final, Parágrafo
Não tenho como negar: Filho da Mãe e Filho do Pai vão estar no meu top de favoritos do ano (e da vida). A escrita do Hugo Gonçalves em não-ficção cativou-me de uma forma sem comparação e estou pronta para ir apregoar por todo o lado o quanto estes livros são fenomenais. Como estava à espera de terminar Filho do Pai para ouvir alguns episódios de podcasts nos quais o Hugo foi convidado, esta semana andei a ouvir algumas coisas em atraso, entre eles este episódio do Ponto Final, Parágrafo.
Coisas que iluminaram a semana
Quero lançar uma petição para que o Corpo de Deus seja sempre entre o 10 de junho e o São João. É que, se a semana de quatro dias me parece uma escolha óbvia, a verdade é que semanas de três dias me parecem ainda melhores. E a semana foi mais curta, mas deu para ir assistir à sessão da Madalena Sá Fernandes na Biblioteca Municipal Florbela Espanca, em Matosinhos, lançar a primeira publicação de uma campanha no trabalho, dizer adeus à paleta de sombras da Aura, gravar a TBR de verão para as redes sociais e ir escrever para o Comfort Cakes. E, se isto não chegasse, ainda houve concerto de David Fonseca e de GNR na Maia.
Até para a semana,
Que vergonha, não fazia ideia nenhuma de que também havia mangericos nos Santos Populares do Porto!