Há uma certa irritação que se apodera de mim quando um homem faz algum comentário sobre mulheres que soa apenas a superioridade de género ou àquela mania de simplesmente implicar. No entanto às vezes custa-me, sinto-me uma péssima feminista, mas acabo a concordar quando um homem diz: é que vocês, mulheres, nem para vocês são boas. Passo a explicar antes de que me atirem para a fogueira.
Não sei se será porque, cultural e historicamente, sempre incentivaram as mulheres a, entre elas, se verem como concorrência (até porque nunca poderiam aspirar a estar no mesmo lugar de um homem), mas parece mesmo que existe esta necessidade de mulheres se verem como concorrência (mesmo que não sejam) e de não torcerem por outras mulheres (ao ponto de votarem num homem acusado formalmente de vários crimes em vez de votarem na mulher - por ser mulher, por ser negra, por ser mulher negra).
Tanto em experiência universitária como de trabalho sempre estive em áreas onde as mulheres estão em maioria, mas o facto de estar cada vez mais atenta a questões de igualdade de género tem-me tornado também mais atenta no que a women-support-women diz respeito e, desculpa, deixa-me triste ver tão pouco apoio entre mulheres. Quero dizer que é mentira, que as mulheres não são assim tão más entre elas, que isso é uma forma de os homens continuarem a pôr as mulheres umas contra as outras, mas não acho que seja. Acho que não é preciso um homem instigar: as mulheres colocam-se umas contra as outras sem ajuda de qualquer homem. Infelizmente, ainda há muito disto.
Sei que, muitas vezes, crescemos sem referências femininas em lugares de topo nas nossas esferas pessoais e profissionais. Mesmo em áreas de comunicação, como a minha, por mais mulheres que haja parece que os homens é que estavam sempre no topo. Mas elas vão chegando a lugares de destaque e, quando uma pessoa ainda quer acreditar um pouco em meritocracia, é bom ver isto acontecer. Então porque é que há mulheres que parece que decidem implicar com outras mulheres só porque sim?
Quanto mais experiência acumulo mais calos surgem e algo que me deixa sempre contente é poder ter mulheres como referência: escritoras que conseguem ter êxito, profissionais de marketing que chegam a cargos de topo… Talvez por isso, perturba-me que haja mulheres que não querem ver outras mulheres ter êxito no que fazem só porque, pensam elas, isso vai tirar brilho ou mérito ou destaque ou outra coisa descabida qualquer ao que elas já fizeram. Não devia ser positivo ver outra mulher poder ter êxito? Não devíamos tentar que outras mulheres tivessem êxito nas áreas delas?
Juro que quero ser uma boa feminista, que quero dizer que realmente não concordo nada quando dizem que as mulheres não se apoiam umas às outras, mas quando a experiência que tenho é a contrária como posso dizer que não concordo? O caminho já é armadilhado o suficiente: por seres mulher, pela idade que tens, pelo meio de onde vens… é mesmo preciso complicá-lo ainda mais? É que o caminho já é difícil, mas parece-me ainda mais longo quando as pedras são postas por outras mulheres.
Esta semana no daylight
Esta semana no blog teve direito a música e livros, duas das coisas mais maravilhosas do mundo:
Primeiro escrevi sobre o concerto do David Fonseca no Coliseu do Porto;
Depois escrevi sobre um dos livros que li para o Alma Lusitana deste mês: A Célula Adormecida, de Nuno Nepomuceno.
A viver nas páginas de…
Descansos, de Susana Amaro Velho
Depois de Inquieta e Bairro das Cruzes, tinha muita curiosidade em voltar a ler algo da Susana Amaro Velho e este novo livro veio mesmo a calhar. Descansos
Laura Alarcão regressa à vila onde nasceu e cresceu para assistir ao funeral da mãe com quem não se relacionava há treze anos. Regressa a uma família devastada, ao escrutínio dos vizinhos que enfrentam os seus próprios fantasmas, a uma verdade dolorosa que a afastou da família durante anos: sente-se culpada pela morte da irmã mais nova que tragicamente caiu a um poço quando eram crianças.
Após anos de afastamento, e à medida que novas revelações contrariam tudo aquilo em que Laura sempre acreditou, relações familiares são postas à prova, numa jornada emocional e sombria onde a busca por respostas deixará um rasto de sacrifício.
Numa saga familiar profunda e comovente, Susana Amaro Velho convida o leitor a refletir sobre redenção e aceitação, sobre a vida enquanto coleção de eventos e consequências emocionais que se desdobram.
Descansos evoca a beleza dos laços que nos unem mesmo quando as maiores tragédias são capazes de nos devastar.
Coisas que iluminaram a semana
Escrevi esta newsletter ao sábado — algo que não acontecia há algumas semanas.
Que é como quem diz: tive um sábado de sessão de escrita, com uma fatia demasiado grande de bolo de chocolate. O tempo não estica, mas poder chegar a domingo com este texto pronto já ajuda.
Até para a semana,